Prof. Jean Möller[1]
Outro tema de extrema importância quando se trata da cultura é a questão de como ela passa a ser difundida e assimilada após os diversos avanços tecnológicos surgidos na modernidade. São os meios de comunicação de massa (m.c.m). Por conta da possibilidade de confusão entre as noções de povo e massa – entenda-se massa como uma parcela da população tratada de forma homogênea e povo como uma camada extremamente heterogênea de uma sociedade – alguns membros da Escola de Frankfurt, na Alemanha, dentre os quais Theodor Adorno e Max Horkheimer, cunharam o termo Indústria Cultural para qualificar o fenômeno da produção da cultura como mercadoria.
Quando se fala de uma indústria de cultura, é óbvio que se circunscreve a análise no interior do fenômeno da urbanização. A primeira possibilidade de transmissão massiva de informações e de entretenimento foi, evidentemente, a do meio escrito, por causa da imprensa, e obviamente a primeira experiência de cultura massificada para a geração de consumo foi a dos folhetins, os precursores das novelas no período do romantismo. A partir desse momento se percebeu que o bem cultural poderia ser utilizado como instrumento econômico a servir a lógica de um mercado que visa unicamente à acumulação.
Com o passar do tempo as possibilidades de se transmitir informações foram sendo ampliadas, e surgem as ondas de telex, rádio, a transmissão de imagens televisivas e mesmo a internet. Segundo Marshall McLuhan o carro, a roupa, o dinheiro ou outros bens simbólicos acabam também comunicando formação e informação, tornando o universo cultural praticamente ilimitado.
É indiscutível a importância dos chamados meios de comunicação na contemporaneidade, mas os posicionamentos apresentados sobre sua contribuição positiva ou negativa com relação à formação dos indivíduos ainda permanecem extremamente controversos. Segundo Teixeira Coelho parece ser possível concordar com Umberto Eco que em sua obra Apocalípticos e Integrados apresenta duas correntes conflitantes sobre o tema. Estes são exatamente os apocalípticos, críticos ferrenhos da Indústria Cultural, e os integrados, defensores dos meios de comunicação ou, pelo menos, pessoas que os aceitam com maior facilidade. Nos termos de Teixeira Coelho lê-se:
De um lado, portanto, estão os que acreditam, como Adorno e Horkheimer (os primeiros, na década de 1940, a utilizar a expressão “indústria cultural” tal como hoje a entendemos), que essa indústria desempenha as mesmas funções de um Estado fascista e que ela está, assim, na base do totalitarismo moderno ao promover a alienação do homem, entendida como um processo no qual o indivíduo é levado a não meditar sobre si mesmo e sobre a totalidade do meio social circundante, transformando-se com isso em um mero joguete e, afinal, em simples produto alimentador do sistema que o envolve. Do outro lado, os que defendem a ideia segundo a qual a indústria cultural é o primeiro processo democratizador da cultura, ao colocá-la ao alcance da massa – sendo, portanto, instrumento privilegiado no combate dessa mesma alienação.
Desse modo, analisar-se-ão agora mais pormenorizadamente os argumentos das duas correntes acima apresentadas na figura de seus principais pensadores. A obra de referência desse estudo será a supracitada, Apocalípticos e Integrados, do autor italiano Umberto Eco. Na verdade, o que é importante perceber é que nenhuma das duas formas de compreensão do fenômeno da Indústria Cultural é perfeita e dá conta de todas as questões, sendo mais enriquecedor, pelo menos num primeiro momento, analisá-las de maneira menos parcial.
No entendimento dos críticos dos meios de comunicação de massa, alguns elementos devem ser postos de imediato em questão. Seguem abaixo as posições mais relevantes desses autores, tal como nos são apresentadas por Umberto Eco:
– Os m.c.m dirigem-se a um público heterogêneo, mas apresentam-se segundo médias de gosto. Com isso, a cultura difundida é do tipo homogêneo, destruindo as características culturais próprias de cada grupo étnico.
– Os m.c.m tendem a provocar emoções intensas e não mediatas, ou seja, ao invés de simbolizarem uma emoção, de representá-la, provocam-na. Daí o fortíssimo apelo da imagem utilizado na atualidade.
– Os m.c.m, colocados em um circuito comercial, estão sujeitos à lei da oferta e da procura, e mesmo quando difundem os produtos da cultura superior, difundem-nos nivelados e condensados a fim de não provocarem nenhum esforço por parte do espectador.
– Enfim, os m.c.m encorajam uma visão passiva e acrítica do mundo. Desencoraja-se o esforço pessoal pela posse de uma nova experiência.
Percebe-se, assim, mesmo de forma resumida, que os meios de comunicação seriam, para os autores mais críticos, um importantíssimo instrumento de dominação, uma forma extremamente eficiente de homogeneizar a maneira de ver o mundo de uma sociedade em função de qualquer que seja a causa, aparentemente, para os mesmos, em função de causas notoriamente econômicas.
Os integrados são representados, sobretudo, pelo canadense Marshall McLuhan. Autor controverso, possui uma obra criticada principalmente pelo caráter lacunar que apresenta, mas que segundo o autor, segue as características do tempo em que é escrita. Seguem abaixo as principais proposições desse e de outros importantes defensores dos meios de comunicação, tal como compiladas por Umberto Eco:
– A cultura de massa não é uma prerrogativa do sistema capitalista ou da sociedade de consumo, ou seja, de compra e venda de mercadorias, mas aparece na China ou na União Soviética, com seus mesmos defeitos e as mesmas virtudes.
– O excesso de informação sobre o presente com prejuízo da consciência histórica é recebido por uma parte da humanidade que, tempos atrás, não tinha acesso aos bens de cultura, nem informações sobre o presente e não era dotada de conhecimentos históricos.
– Não se pode negar que o acúmulo de informação, mesmo que seja apresentada de forma indiscriminada, deve levar necessariamente a algum tipo de formação, e não admitir isso significa trabalhar com níveis de pessimismo acima do racionalmente aceitável.
– Uma homogeneização dos gostos contribuiria, no fundo, para eliminar, a certos níveis, as diferenças de casta, para unificar as sensibilidades nacionais, e desenvolveria funções de descongestionamento anticolonialista em muitas partes do globo.
Enfim, o debate entre as duas concepções parece girar em torno de uma polêmica central. O que para os integrados deve ser considerado como uma democratização da arte e da informação, segundo os apocalípticos deve ser compreendido como um fenômeno de banalização da cultura, das artes e da informação. Seja como for, o tema da cultura por certo ganhou bastante em complexidade após o desenvolvimento das formas tecnológicas de sua difusão. É em nosso tempo impossível que alguém que deseje ter o mínimo de noção sobre o mundo que o cerca se furte a refletir minimamente sobre a influência das ideias transmitidas de maneira cada vez mais rápida para uma parcela cada vez maior da humanidade.
AGORA É SUA VEZ:
1. O que significa Industria Cultural?
2. Qual a função dos meios de comunicação em massa (m.c.m.), segundo os autores citados no texto
[1] Material didático de apoio corrigido e adaptado por Jean Möller.
